Caráter Mocho em bovinos da raça Caracu

O Caracu é a mais antiga e representativa raça crioula do Brasil. Descende de bovinos taurinos  (Bos taurus taurus) trazidos da Península Ibérica desde o início da colonização, que haviam  passado pelo processo de seleção para sobreviver nos trópicos antes da disponibilidade de  métodos efetivos de controle de ecto e endoparasitas. Diversas raças portuguesas do tipo  aquitânico ou turdetano contribuíram para a formação do Caracu, todas com presença de chifres  (aspadas). Em 1900, o Caracu era uma das raças de maior expressão na pecuária brasileira. Em  1909, o Instituto de Zootecnia (IZ) criou o primeiro posto de seleção oficial da raça e, em 1916, foi  fundada a Associação Brasileira de Criadores de Caracu (ABCC). 

Atualmente, além da variedade Padrão/Aspada, com chifres, a raça Caracu possui também a variedade Mocha. Sua criação foi fruto de uma iniciativa para preservar o material genético da raça  crioula Mocho Nacional, a partir da década de 1990, já que estudos conduzidos pela Embrapa  mostravam que esta raça não tinha condições de ser preservada sozinha dado o pequeno  contingente de animais puros remanescente. O Mocho Nacional teve origem nos estados de Goiás,  São Paulo e Minas Gerais, como resultado de cruzamentos entre os bovinos crioulos do Brasil e  reprodutores mochos importados da Inglaterra, no início do século XX. 

Note que tanto o Caracu quanto o Mocho Nacional já tinham associações e livro de registro no início  dos anos 1900. Entretanto, devido a disputas políticas com os criadores de zebu da época,  acabaram sendo fechadas por volta de 1960 e reabertas apenas em 1980, o que levou a uma  grande perda de material genético de ambas as raças. 

No processo de criação da variedade Mocha do Caracu, além dos exemplares remanescentes da  raça Mocho Nacional, e dos animais Caracu aspados, foi aberto o livro de registro de machos  Caracu da variedade mocha, por um curto período de tempo, com o registro de alguns poucos  animais de origem desconhecida que deixaram contribuição na raça. Também foi permitido o uso  do Romosinuano, uma raça crioula mocha da América do Sul, para ampliar a base genética na  formação do Caracu Mocho. Isto foi bastante inovador, por ser feito de uma forma bastante  transparente em que o uso do Romosinuano era registrado na associação e constava dos registros  dos animais. 

Com o tempo, o interesse na variedade mocha do Caracu cresceu muito e este texto tem por  objetivo esclarecer a genética de taurinos mochos e auxiliar os criadores de Caracu que desejam  incorporar o gene mocho em seu rebanho. Esclarece também sobre a presença de batoques em  alguns animais mochos.

 

Touro Caracu variedade Padrão, com chifres.

Touro Caracu variedade Mocha

 

Touro Caracu variedade Mocha, com batoques

 
 

Genética de Taurinos Mochos 

De forma simplificada, a presença ou ausência de chifres em taurinos de corte é controlada por três genes conhecidos: 1) o gene do chifre africano, 2) o gene do caráter mocho tradicional e 3) o gene  do batoque. 

1) O gene do Chifre Africano 

Este gene tem dois alelos: o alelo CA que condiciona a presença do chamado “chifre africano” que  é dominante sobre o alelo ca. Este gene tem efeito epistático sobre o gene do “caráter mocho”,  interferindo na expressão do caráter mocho. Os animais portadores de um ou dois alelos CA  (heterozigotos e homozigotos) sempre terão chifres, independente do genótipo para o gene do  caráter mocho. Apenas nos animais caca, o genótipo do gene do caráter mocho vai se manifestar  e condicionar o aparecimento de chifres ou não. 

Este gene é pouco mencionado porque, em função de ser dominante, ele é muito mais fácil de ser  eliminado de uma população em que se está fazendo seleção para fixar o caráter mocho. Uma vez  que o animal nasceu mocho, já se sabe que ele é caca e não há a possibilidade de um alelo CA  ficar “escondido” em um animal heterozigoto. Assim, animais de chifre, filhos de pai e mãe mochos,  já não tem chance de ter o alelo CA que condiciona aparecimento de chifres. 

Podemos identificar portadores desse alelo entre os animais de chifre que têm uma grande  dificuldade de produzir filhos mochos, mesmo quando acasalados com animais mochos. Isso é mais  fácil identificar nos touros que costumam ter muitos filhos. 

2) O gene do Caráter Mocho 

Este é o principal gene de interesse para aqueles que querem selecionar para o caráter mocho. Ele  tem dois alelos, o alelo do mocho (M) e o alelo do chifre (C). A característica de ser mocho é  fortemente controlada pela genética, com muito pouca influência ambiental. Os animais  mochados artificialmente são, normalmente, de fácil identificação. 

O alelo mocho é dominante sobre o alelo de chifre, que é chamado recessivo. Assim: • Um animal com dois alelos mochos (mocho homozigoto, MM) será sempre mocho. 

• Um animal com um alelo mocho e um alelo de chifres (mocho heterozigoto, MC) também  será mocho, mas poderá transmitir qualquer um dos alelos à progênie, podendo,  dependendo do genótipo do animal com que acasalar, produzir filhos de chifre. 

• Um animal com dois alelos de chifre (homozigoto de chifre, CC) sempre terá chifres. 

Antigamente, somente era possível identificar a genética de animais mochos (homozigoto ou  heterozigoto) com a avaliação do resultado de sua progênie (bezerros mochos ou com chifres).  Existem atualmente testes de DNA específicos para determinar a genética de animais mochos,  acelerando a incorporação do gene mocho nos rebanhos. Entretanto, em função de eles se  basearem em marcadores próximos ao gene do caráter mocho e não na mutação causal (que ainda  não foi identificada) eles precisam estar calibrados para a sua população para funcionar.  Recentemente, o teste de um grande volume de animais mochos Caracu classificou quase metade  deles erroneamente como de chifres.

Resultados dos cruzamentos para animais sem o alelo do Chifre Africano.

MM - Mocho Homozigoto 

  • O animal mocho homozigoto será sempre mocho e irá  produzir somente bezerros mochos (ou com batoques),  mesmo que acasalado com animais com chifres. 

  • Alguns autores acreditam que o batoque não se manifesta  no animal mocho homozigoto. 

  • O uso desse tipo de animal acelera a incorporação do  gene mocho no rebanho.

MC - Mocho Heterozigoto 

  • O animal será mocho (ou com batoques), embora  carregue um alelo mocho e outro de chifres. 

  • Quando acasalado com animais mochos homozigotos, a  progênie será 100% mocha (ou com batoques). 

  • Quando acasalado com outros animais mochos  heterozigotos, sua progênie terá 25% de animais com  chifres e 75% de animais mochos (ou com batoques),  sendo que 50% serão mochos heterozigotos e 25%  mochos homozigotos. 

  • Quando acasalado com animais com chifres, produzirá  metade da progênie mocha (ou com batoques) e metade  com chifres.

CC - Com Chifres ou  Aspado

  • O animal terá chifres. 

  • Quando acasalado com animais mochos homozigotos,  produzirá somente bezerros mochos. 

  • Quando acasalado com animais mochos heterozigotos,  produzirá metade da progênie mocha (ou com batoques) e  metade com chifres. 

  • Quando acasalado com animais com chifres, produzirá  somente bezerros com chifres.

Entendendo a presença de batoques em animais mochos 

O chifre é uma estrutura córnea rígida que possui um núcleo ósseo que é o prolongamento do osso  frontal do crânio. O batoque, por sua vez, não é ligado ao crânio; é móvel e pode variar de um  simples botão até o tamanho de um chifre normal, quando é conhecido por "banana". Entretanto,  principalmente em machos, existe a possibilidade de o batoque nascer descolado do crânio e, com  a idade, se fundir com a base do crânio, ficando semelhante a um chifre e causando o mesmo tipo  de inconveniente que um animal de chifres pode ter. 

Enquanto o chifre condiciona um problema de manejo, impactando na interação dos animais,  principalmente em ambientes confinados (confinamento, currais, etc.) e sendo um fator de risco na  ocorrência de lesões, o batoque é um problema exclusivamente estético, onde alguns criadores dão  preferência a animais sem a presença de calo ou batoque (“carecas”).  

O fato de o animal não ter batoques não quer dizer que ele é homozigoto para o alelo mocho. Alguns  animais heterozigotos são mochos “carecas” e não têm nenhuma dessas estruturas (calo/batoque).

Os batoques são herdados geneticamente, mas controladas por um gene diferente do gene de  chifres/mocho. A expressão do gene do batoque é influenciada pelo sexo (mas não é controlada  pelo cromossomo sexual): 

Machos: o gene é considerado dominante (1 cópia já expressa batoque, BB e Bb). 

Fêmeas: gene considerado recessivo (precisa de 2 cópias, BB, para expressar batoque, o  animal Bb não tem batoque). 

Em ambos os sexos, o animal bb não tem batoque ou calo. 

Animais CC não desenvolvem batoques, apenas chifres. Animais mochos homozigotos (MM) não  apresentam batoques ou têm uma incidência muito mais baixa de aparecimento de batoque (é o  que se acredita no momento). Portanto, os batoques aparecem predominantemente em animais  mochos heterozigotos (MC). 

Touros mochos heterozigotos (MC) sem batoques não carregam o alelo que condiciona o  aparecimento do batoque.

Literatura consultada 

ALENCAR, M. M. de. Canchim mocho: como obtê-lo. São Carlos, SP: EMBRAPA-UEPAE de São  Carlos, 1992. 19 p. (Embrapa-UEPAE de São Carlos. Documentos, 15). Disponível em:  https://www.infoteca.cnptia.embrapa.br/infoteca/bitstream/doc/43677/1/PROCIDoc15MMA1992.00051. pdf. Acesso em: 01 ago. 2025. 

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE CRIADORES DE CARACU. Características da Raça Caracu.  Disponível em: https://www.abccaracu.com.br/raca-caracu. Acesso em: 01 ago. 2025. 

MERCADANTE, M. E. Z. Caracu, o Bos taurus brasileiro adaptado aos trópicos: experiências de um  programa de seleção para peso ao sobreano. Agrociência, v. 9, p. 485-494, 2005. Disponível em:  https://www.acuedi.org/ddata/5708.pdf. Acesso em: 01 ago. 2025. 

ROSA, A. do N.; SILVA, L. O. C. da; PORTO, J. C. A. Raças mochas: história e genética. Campo  Grande: EMBRAPA-CNPGC, 1992. 64 p. (EMBRAPA-CNPGC. Documentos, 50). Disponível em:  https://www.infoteca.cnptia.embrapa.br/infoteca/bitstream/doc/324606/1/DOC50.pdf. Acesso em: 01  ago. 2025. 

SHORTHORN BEEF. Poll testing. Summer Magazine, p. 40-41, 2018. Disponível em: https://shorthornbeef.com.au/wp-content/uploads/2024/04/Shorthorn-Beef-Poll-Testing-Fact-Sheet 1.pdf. Acesso em: 01 ago. 2025.

Elaboração 

Carlos Mauricio Soares de Andrade 

Engenheiro-agrônomo, doutor em Zootecnia, pesquisador da Embrapa Acre, Rio Branco, AC 

Roberto Augusto de Almeida Torres Junior 

Engenheiro-agrônomo, doutor em Animal Breeding, pesquisador da Embrapa Gado de Corte, Campo  Grande, MS





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